Quais são os avanços de pesquisadores sobre Cannabis medicinal e sequelas da Covid-19? Trazemos um panorama com a ajuda de um especialista no assunto!
No início da pandemia, a corrida científica visava medicamentos e opções terapêuticas para a fase aguda da Covid-19. Agora, com a vacinação, estamos buscando melhorias para o tratamento das sequelas deixadas pela infecção pelo SARS-CoV-2. Nesse contexto, seria a Cannabis uma alternativa viável?
O coronavírus (SARS-CoV-2) é um betacoronavírus, que primariamente infecta animais, com transposição recente aos seres humanos. Para combater as complicações que a infecção pelo vírus pode causar, são necessários muitos estudos sobre o assunto.
Para nos ajudar a compreender o papel da Cannabis medicinal no tratamento dessas sequelas, contamos com a colaboração do Dr. Wilson Lessa Junior, médico psiquiatra. Continue lendo para saber mais!
Como o coronavírus entra em nosso corpo?
Como já se sabe, a infecção pelo coronavírus não se manifesta da mesma forma em todos os pacientes. Sabemos que a proteína S (spike) do vírus interage com o receptor de ACE2 (receptor de angiotensina) localizado em células específicas.
É notório que o ACE2 esteja em grande quantidade no sistema respiratório — sabidamente o mais afetado na fase aguda da infecção. No entanto, ele também está presente no sistema nervoso central, no sistema circulatório e nos olhos. De maneira curiosa, a maioria das complicações do vírus está relacionada a esses órgãos.
Quais são as fases da Covid-19?
Podemos dividir o processo da infecção pelo SARS-CoV-2 em etapas claramente distintas. Logo no início do contágio, a resposta imune adaptativa é fundamental — daí a importância da vacina, especialmente para esse primeiro momento.
A partir desse momento, algumas pessoas desenvolvem uma complicação inflamatória, considerada a segunda fase. Ambas as fases constituem a parte ativa da doença, em que ainda há atividade viral no corpo do paciente.
A terceira fase, por sua vez, é caracterizada pelas sequelas da Covid-19. Nessa etapa, já conseguimos extirpar o vírus, porém, convivemos com a atividade inflamatória anormal em algumas partes do corpo. De acordo com o professor Wilson Lessa, “existem indicativos de que os canabinoides podem ajudar nessas três fases da doença”.
O que já se sabe sobre Cannabis e o tratamento de sequelas da Covid-19?
O uso medicinal dos canabinoides já é cientificamente comprovado para algumas doenças. Na fase de resolução das sequelas da Covid-19, ainda não existe nenhum estudo comprovado sobre sua eficácia; no entanto, existem diversos precedentes para que investiguemos melhor essa possibilidade terapêutica.
Em pesquisas de eficácia da Cannabis em outras doenças, constatamos que ela pode diminuir a atividade inflamatória. “Na infecção pelo influenza, por exemplo, já existe um medicamento à base de canabidiol, que agoniza os PPAR (receptores nucleares hormonais) — responsáveis pelo controle da homeostase, do equilíbrio da glicose, dos lipídios, da energia e das atividades inflamatórias”, comenta o especialista.
Por que estudar o pós-Covid?
São muitos os sintomas deixados pela infecção da Covid-19. Antes, se pensava que apenas os casos mais graves deixavam sequelas importantes. Porém, hoje sabemos que existem casos de pacientes assintomáticos com sequelas mais severas do que as de casos agudamente sintomáticos.
Uma vez observada a diminuição de casos e óbitos pela Covid-19, principalmente graças à vacinação, os olhos da ciência se voltam para o que o vírus deixou para trás: as sequelas. Nelas, o componente inflamatório e a disfunção tecidual são pontos-chave — e são neles que o canabidiol pode ajudar.
Além disso, sabemos que o canabidiol tem ação ansiolítica e pode ajudar em distúrbios de humor. Essas são algumas das sequelas já conhecidas da Covid-19, que estão sendo estudadas pelo Dr. Wilson. Acreditamos, portanto, que esse tratamento possa atuar em diversos mecanismos para combater as sequelas da Covid-19.
Quais são as expectativas com o estudo com o canabidiol?
O canabidiol possui ação anti-inflamatória tão potente quanto os corticoides — que podem ter um perfil de efeitos colaterais ainda mais danosos. Atualmente, o foco dos estudos está na dosagem otimizada do medicamento, que maximize seu efeito terapêutico.
Para termos um efeito de comparação, estudos sobre a Cannabis na Doença de Crohn utilizaram uma dose de 0,5mg/kg, que pode ser considerada baixa em outras doenças.
É importante frisar que já existem dois estudos sobre o uso da Cannabis no tratamento das sequelas da Covid-19: um no Brasil (que usa o canabidiol mais purificado) e outro em Israel, que foca pacientes internados em estado grave.
“Esperamos que o canabidiol consiga reduzir os níveis plasmáticos da IL-6 e 8. Isso é interessante, pois o que causa a tempestade de citocinas é justamente o aumento do nível de interleucinas em nosso organismo”, explica Lessa.
A Cannabis também diminui o TNF-α (fator de necrose tumoral alfa), por meio do agonismo dos receptores de adenosina. Além disso, ela reduz a inflamação pulmonar, aumentando o efeito imunomodulatório. Com isso, ocorre a redução da fibrose pulmonar e infiltrados de polimorfonucleares.
Quais são as necessidades de estudar a Cannabis medicinal e o sistema endocanabinoide?
Quando falamos do uso da Cannabis, estamos tratando de uma modalidade de tratamento que pode se tornar uma especialidade ou uma área de atuação. Isso porque os canabinoides se encontram por toda parte, sendo produzidos tanto em mamíferos quanto em plantas e vegetais.
Nas palavras do Dr. Wilson, professor da Universidade Federal de Roraima, “aqui em Boa Vista só eu prescrevo. Atendo pacientes neurológicos, reumatológicos, e o sistema endocanabinoide está em qualquer lugar”.
Os estudos sobre o uso da Cannabis para reduzir os impactos causados pela infecção da Covid-19 já são uma realidade. Apesar de ainda não conseguirmos atestar sua eficácia, acreditamos que os estudos sobre o assunto evoluam para uma resposta positiva sobre a pesquisa.
Se você quiser ir mais à frente no assunto, baixe nosso e-book e fique por dentro das informações mais atualizadas sobre o uso da Cannabis medicinal.
Colaborou para este texto:
Wilson Lessa Jr, médico psiquiatra, graduado pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), com residência em Psiquiatria pela Santa Casa de Misericórdia de Campo Grande-MS. É especialista em Psiquiatria e Psiquiatria Forense pela AMB/ABP.
É professor do Curso de Medicina da Universidade Federal de Roraima (UFRR), além de membro da Society of Cannabis Clinicians (SCC), da International Association for Cannabinoid Medicines (IACM), da International Cannabinoid Research Society (ICRS). Também é professor das Pós-Graduações em Cannabis Medicinal do Grupo Ânima/Inspirali e da WeCann Academy.